domingo, 10 de fevereiro de 2013

Olhar Cheio de Luz (19)

Umas braçadas na água. A água fria arrepiou-o por momentos. Água parada num tom de cor cinzento-azulado. Muitas vezes ali havia tomado banho e naquele momento recordou muitos dos momentos de pura felicidade que as gargalhadas de criança que pareciam continuar ali perpetuando-se no tempo. 

Entrou dentro da água o mais que pôde e deixou que o corpo aliviado do stress subisse à tona e amortecido ali se manteve. Os olhos fechados e a respiração funda encheram de oxigénio e felicidade o sangue e o espírito. Desejou, nesse momento, transformar-se em nada ou em água e deixar que uma onda o transferisse sem tempo para o outro mundo. 

Encheu, forte, os pulmões e aliviou-os da pressão esvaziando-os lentamente meditando no seu sonho. Esboçou um sorriso ao pensar no sonho americano, o dele, que era tão diferente do das histórias de cowboys que na adolescência devorara. Simplesmente queria estar perto da pessoa que insistia em lhe invadir a mente e o coração. Abriu os olhos e voltou a cerrá-los porque o sol os inundara de luz directa. 

Saiu da água, deixou-se secar por momentos, ansioso por que a água se evaporasse quanto antes, não fosse chegar alguém e o encontrasse ali praticamente nu. Sabia que sendo feriado alguém poderia ter escolhido aquele espaço para passear à beira rio. O sol foi generoso e enxugou-o num ápice. 

Sentia-se pairar de felicidade. O amor era isso mesmo, pensava, estar longe de quem se ama mas não deixar de viver cada momento de coração palpitante. Amar exige morte de si mesmo  para que a pessoa amada possa sentir-se livre para fazer escolhas, para crescer, para fazer caminho, mas sentindo-se sempre protegida por um escudo invisível e de alta segurança, a energia positiva a que se chama amor. O sentido da palavra tão pronunciada e banalizada, hoje em dia, despe-se completamente de sentido de cada vez que quem julga amar se busca mais a sim mesmo, aos seus desejos, apetites e vontades, que ao outro. É por isso que o amor não se faz mas se constrói e se vive: se constrói subindo, degrau a degrau, as escadas de encanto ou desencanto, apoiando-se sempre  na certeza de se viver para o outro e por causa dele. Hoje sabia-se consciente de que amava verdadeiramente. 

Desembrulhou algumas das memórias na sua mente guardadas e viu a diferença do que agora sentia e de tantas outras vezes em que disse amar, mais sentindo prazer na voz, no olhar e no corpo, de algumas outras mulheres, que no querer que elas fossem livres e caminhassem com ele, a seu lado, não como ele queria. 

Sentiu-se despida por um olhar indiscreto. Rangeu os dentes. Pegou o livro…