sábado, 20 de outubro de 2012

O Céu falou (10)


Noite de sábado para domingo. O vendaval fez-se presente com frio chuva e vento. Noite terrível. O dia de domingo amanheceu chuvoso. O funeral estava marcado. O tempo parecia não querer colaborar. Os amigos vieram às centenas. Era um homem benquisto lá na terra. Uma da tarde, chegam as primeiras pessoas. A chuva pára. Tudo está preparado para o  momento da última despedida cá na terra. Uma hora depois, o padre vem e o silêncio torna-se ainda maior: inicia-se a celebração. A chuva, como em momento de graça, tinha parado. 

É a última vez que o seu corpo está na casa que, em muitos anos, foi o templo do sofrimento e das alegrias do casamento. Duas filas se organizam e o cortejo avança. Céu nublado. 

O nosso homem do banco de madeira olha o céu em jeito de implorar dele um sinal. E ele aconteceu: o céu de nuvens abriu-se em acto de milagre, as nuvens romperam-se e um nesga de sol brilhou por uma questão de segundos. Mais ninguém viu, mais ninguém sentiu, mais ninguém olhou, mas essa era a certeza de que, lá do céu, com uma ternura de mãe, aquele pai olhava os seus filhos. Os raios de sol tocaram-lhe o coração, que, embora a tristeza se mantivesse, deixou cair a amargura e se encheu de esperança. A caminhada para a igreja, e mais tarde para o cemitério, tornou-se leve e a escuridão deu lugar a uma luz doce.

Terra fria. Terra molhada. Terra danada e agre cobre a urna. O seu corpo desaparece para sempre. O regresso tranquilo de todos a suas casas, a chuva permitira isso, para depois voltar a cair, desalmadamente, sobre tudo e todos. O milagre acontecera, a sua oração fora ouvida, o tempo parou para permitir que o funeral decorresse sem quaisquer percalços.

Voltou a casa. Trazia agora a certeza que em tempos de catequese apreendera das palavras da sua catequista: Deus existe. Deus é Pai. Deus é Misericordioso. Deus olha por nós, em qualquer momento e situação.

Confortou-o a esperança de que seu pai estava vivo, agora na intimidade de Deus, agora ainda mais próximo de seus filhos. As lágrimas não corriam já, pois haviam dado lugar a um sentimento de gratidão. Deus chamara seu pai porque o queria junto de Si, porque o não queria ver sofrer mais, porque tinha um lugar preparado pare ele na Eternidade, porque Ele assim quis. Sentia agora seu pai bem mais próximo que quando o podia tocar, sentir e beijar. Sorriu fundo, sem nada dizer a ninguém, mas sabendo ser agraciado por Deus. A vida acabava de ganhar um sentido novo, seu pai estava ressuscitado em Deus.

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